Ora vamos a ver então...
Escreveu assim o Record à uns anos atrás:
«A partir dos anos 60, o Benfica aparece como grande figura da união nacional, alimentando um sentimento patriótico com a conquista das Taças dos Campeões Europeus em 1960/61 e 1961/62.»
in Record, 25-04-2013
Portanto e na realidade, o regime salazarista apareceu de "mãos dadas" ao Benfica na década de 60!
A televisão dava os primeiros passos em Portugal mas, em Maio de 1961, a presença do SLB na final da Taça dos Campeões Europeus, mereceu honras televisivas e o jogo foi transmitido em directo (senão a promeira, uma das primeiras transmissões televisivas de um jogo de futebol).
E se a presença na final já tinha sido motivo para “anestesiar o povo”, após a vitória (3-2, frente ao FC Barcelona... já agora num jogo em que a principal figura foram os postes quadrados da baliza encarnada...) a propaganda do regime não fez por menos: durante toda a semana, uma vez por dia, a RTP transmitia o jogo em diferido!
Mas a coisa não se ficou pelos habituais instrumentos da propaganda – jornais, rádio e televisão. A colagem e interesse do regime no sucesso benfiquista - e vive versa... - foi demonstrada ao mais alto nível.
Assim, após terem sido recebidos no Palácio de Belém, onde o Presidente da República, Américo Tomás, lhes atribuiu a medalha de mérito desportivo, jogadores treinador e dirigentes do SLB foram também recebidos pelo homem forte do regime, o Presidente do Conselho, António Oliveira Salazar, o qual manteve com os elementos da comitiva benfiquista uma conversa amistosa, em que manifestou o seu apreço pela vitória alcançada e pela expressão que a mesma teve como serviço prestado à pátria.
Oito dias antes da final de Berna, no dia 23 de Maio de 1961, estreava-se pelo SLB (num jogo de reservas contra o Atlético) um jovem moçambicano proveniente do Sporting de Lourenço Marques (filial do SCP): Eusébio da Silva Ferreira. A rábula da transferência, o ultrapassar "pela esquerda" ao rival lisboeta e até o esconder até a coisa ficar feita é por demais conhecida portanto nem vale a pena disso falar mais!
Eusébio rapidamente se tornou a figura de proa do SLB, sendo um elemento preponderante nos sucessos, a nível interno e europeu, dos encarnados durante a década de 60 do século XX.
Em 1964, quando a “Pantera Negra” já era uma estrela futebolística, conhecido em toda a Europa, a Juventus fez-lhe um tentador convite, oferecendo-lhe 25 mil contos. Quase na mesma altura, o Real Madrid, por influência de Di Stefano (seu ídolo da juventude), fez uma oferta igual.
Eusébio, que tinha apenas 22 anos, ficou eufórico ante a perspectiva de se transferir para Turim ou Madrid, mas “Salazar mandou-me chamar e disse-me que eu não podia sair do País, porque era património do Estado! Fui prejudicado nesse momento. Hoje teria uma grande fortuna”.
Dois anos depois, após o Mundial de 1966, Eusébio e a sua mulher foram gozar férias para Itália, a convite do Inter de Milão, clube com o qual chegou a ter tudo acertado. O colosso italiano pagava-lhe 90 mil contos para assinar contrato, uma fortuna para a época (o equivalente a cerca de três milhões de dólares).
Disse Eusébio: “Naquele tempo dava-me para comprar os Restauradores”.
Mas, mais uma vez, surgiram obstáculos à sua saída. Para além da intransigência de Salazar, entretanto a Itália fechou as suas fronteiras a jogadores estrangeiros.
Outros convites se seguiriam, mas o clube encarnado, com o apoio do regime, foi irredutível e só permitiu a sua saída no final da carreira, em meados da década de setenta.
A propósito dos obstáculos que ele e outros jogadores do SLB enfrentaram nos anos 60 e que os impediram de sair para clubes estrangeiros, Eusébio afirmou:
“Queria ir para Itália, fui travado, houve muitos casos de outros colegas meus que não puderam sair, mas nunca houve ameaças.”
in Record, 25-04-2013
Podemos então falar na maior ou menor proximidade de alguns dirigentes do SLB ao regime, ou em desviar as atenções para aspectos meramente acessórios (como a letra do hino), mas factos são factos e a realidade é só uma: o regime primeiro cavalgou o sucesso internacional dos encarnados e depois, naquilo que verdadeiramente interessa, tratou de criar as condições necessárias para que esse sucesso se mantivesse, fazendo do SLB e do seu principal jogador um dos símbolos do Portugal dos 3 F’s (Fátima, Fado e Futebol).
Dúvidas??? Perguntem ao Calabote...