Reparei que estava com 1999 posts colocados e não podia deixar passar o número 2000 sem partilhar qualquer coisa de especial aqui com a comunidade. Por isso, decidi pôr-me em modo de Canal História e contar uma que me sucedeu, e a um amigo, já lá vão mais de 20 anos, no tempo em que em Lisboa, a "caça" se fazia essencialmente na rua e o trottoir lisboeta fervilhava de gentis (algumas, outras, nem tanto...) moças de todas as idades, tamanhos, feitios, credos, cores, disponibilidades e capacidades sexuais (mesmo! ).

Nesse tempo, eu e o meu amigo C., hoje casado, pai de filhos e há basto tempo retirado da actividade de "cavaleiro das esquinas", costumávamos meter-nos no escalavrado Mini branco que o pai deste, excelente pessoa mas fonas histórico, lhe tinha comprado em 14ª mão, baptizado por nós MM (Mini das Meninas) e ir fazer o circuito nocturno lisboeta do ataque de rua. Passagem pelo Técnico e umas voltinhas para ver quem por lá andava a polir passeio, descida para o Conde de Redondo com o mesmo fito e depois término na Avenida da Liberdade, que era nessa altura como que os Campos Elísios do putanheiro digno desse nome e onde um rapaz aventureiro podia fazer toda uma educação carnal, desde manhã fresca até horas de curso nocturno.

Pois foi precisamente na Avenida da Liberdade, na lateral à direita de quem desce para os Restauradores, um pouco antes da esquina da Rua das Pretas, por uma noite de friagem outonal, que o Mini das Meninas começou a tossir como um octogenário que ainda insiste em fumar dois maços de tabaco por dia e pura e simplesmente parou, com um derradeiro arranco do motor tuberculizado. Mesmo ali no meio da acção, entre a intensa circulação de pequenas, clientes, souteneurs, mirones, dois ou três perverts, bêbados, peões, marujada e até alguns turistas que recolhiam aos seus hotéis. (As pessoas hoje não podem imaginar o cafarnaum que era aquela "zona quente").

Sugeri ao C. deixar ali o carro e voltar no dia seguinte, a horas mais convenientes, com o reboque da garagem, mas ele não queria abandonar a fiel viatura nem por nada. E enquanto eu o tentava convencer do contrário e ele expunha os seus argumentos, as meninas, curiosas, intrigadas, sorridentes, vinham-se aproximando do MM, batendo nos vidros acenando e fazendo outras provocaçõezinhas, que nos transformaram rapidamente no centro das atenções. Sobretudo quando o C. decidiu sair do carro, levantou o capô e começou, ali mesmo, no meio daquele trânsito libidinoso, daquele bazar do sexo pago, daquela correnteza de pecado, a tentar detectar e arranjar a avaria.

Mais encavacado que uma beata num congresso de sexólogos, lá saí do carro também e fui pôr-me ao lado do meu condutor, enquanto éramos alvo de piadinhas, remoques e tentações as mais variadas: "Se não tens guita pra mandar arranjar o carro, também não deves ter pra foder..."; "Ó lindos, deixem lá isso, venham mas é comigo e com a minha amiga ali à pensão, depois chamas o riboque..."; "Ó querido, tira mas é daqui a carripana que distrais a clientela..."; "Isto aqui é pra foder, não é pra arranjar carros..."; "Faço os dois por cinco mlienas, vamos a isso?".

Por esta altura, além do abundante miudame, já havia também três ou quatro fulanos ao pé de nós a deitar palpites. "Isso devem ser as velas, amigo"; "Mais vale chamar o reboque que com este GPs todo aqui não se consegue consertar nada..."; "Isso já não tem conserto, chefe, é sucata com ele". Até que das sombras da placa central surgiu um tipo fininho, que pelo bigode e cabelo à equipa do FC do Porto dos anos 70, e trajar geral, compunha o tipo chapado do chamado chuleco lisboeta. Eu e o G. pensámos que o pintas nos vinha dizer para nos deixarmos de armar em mecânicos e darmos corda aos sapatos, porque estávamos ali a prejudicar o "negócio".

Mas nada nisso. Lá chuleco era ele, mas em vez de ameaçar traçar-nos as caras, veio foi dar-nos uma mãozinha na mecânica. Como explicou enquanto olhava para o motor que o C. iluminava com uma lanterninha que tinha sempre no porta-luvas, o sujeito, antes de se dedicar à actividade de gestor de activos femininos na rua, tinha sido "da arte" e trabalhado numa garagem algures na Graça. E devia ter sido bom mecânico, porque em meia-dúzia de minutos pôs o MM a trabalhar, aconselhando ainda, enquanto limpava as mãos a um lenço bedungoso, a pôr o carro na "garage logo de manhã, chefe". Alvitrei ao C. que seria da mais elementar boa educação darmos uns cobres ao homem pela sua (inesperadíssima) amabilidade, e como o meu amigo não tinha trocos, estendi eu ao prestável azeiteiro uma nota de mil paus. Que o dito declinou calma mas firmemente, acompanhando a recusa de uma frase que nunca mais esqueci: "Obrigado chefe, mas não aceito dinheiro de homens". (Errrrrrrr... Pois!).

O MM aguentou até minha casa e depois até casa do G. No dia seguinte foi a arranjar e ainda durou mais quase dois meses, tendo expirado de vez pouco depois do Natal desse ano, em Benfica, à vista do Califa, e tido como destino a sucata. Parafraseando os antigos, Sic transit gloria Mini (das meninas).

Nesta data pródiga em efemérides ( uma certa Miss atingiu a centena de páginas ) ofereço os meus cumprimentos ao muito estimado eduardob e dou-te os parabéns pela duo milena de posts , sempre esclarecido , sempre constante ,incisivo quando necessário , irónico , franco e com uma capacidade literária impressionante que delicia os foristas leitores da tua prosa.
Que esta e outras efemérides se repitam uma e mais vezes , fazes cá falta.

P.S. não acredito que eras tão verdinho à vinte anos que estavas encavacado quando saíste do MM

Abraços.

Caro confrade peter, muito obrigado pelas tão amáveis palavras, ora essa, é demasiado generoso. (Eu escrevi "mais de 20 anos"... Hehehehe! Mas se verdinho já não era, realmente, sempre fui um moço um bocado tímido, acredite...). Pegue lá um grande abraço!

Os meu parabéns eduardob , as saudades que eu já tinha de ler essas crónicas muito bem escritas por ti , dos anos dourados do GPs de Lisboa .

Mais uma vez os meus sinceros parabéns , e que nos continues a brindar com estas pérolas de escrita da arte fodenga

Abraço ,

jm354

Este é daquele tipo de eventos os quais eu não posso deixar branco!


Parabéns pelas 2 milenas caro EduardoB! Já cá faltava um relato dos teus pá!




Grande abraço!!!!


P.s.: Só falta é um tdzito prá festarola ficar completa!

O meu caro confrade fez-me também regressar a mais de 20 anos atrás.
Com um amigo, varríamos literalmente as ruas da baixa de Coimbra.
Procurávamos "carne fresca", apetecível.
Em restaurantes e bares da cidade nos cruzámos com toda uma quase incaracterística nuvem de pessoas.
Não descurávamos igrejas e museus ...
Finalizávamos, quase invariavelmente, em bares.
Nos quais ouvindo música ao vivo se ia descontraindo as convidadas.
Seguindo depois, se fosse o caso, para a consumação do que nos tinha feito sair.
Tornou-se um vício difícil de abandonar.
Andámos nisto anos, vários carros meus sofreram as agruras de estradas
esburacadas, estacionamentos não recomendáveis e represálias de invejosos.
As fintas a porteiros de hotel e gerentes e donos(as) de pensões são incontáveis.
As "directas" foram mais que muitas e, no entanto, no dia seguinte ou
o "engate" se tinha prolongado, ou então nos encontravámos à mesma
hora no mesmo local.
Não tenho saudades, nem sei bem se gostaria de voltar atrás e reviver esses
momentos. Vejo-os como uma passagem da qual tenho uma boa recordação
mas sou dos que crendo que a vida vive-se uma única vez não faz sentido
tentar prolongar, através da nossa memória, o que já foi vivido.
Lembro igualmente que há cerca de uma ano me chateei definitivamente com
esse meu parceiro de farras, de jantares duplos, de copos... por uma banal
imbecibilidade.
Caro confrade as minhas saudações e felicitações pela sua bem elaborada
prosa, pela sua vivência e pelos seus 2000!

Parabéns caríssimo confrade!
...pela efeméride e pela forma como a assinalou
Um abraço

Parabéns Caro Confrade.
Parabéns pela sua, sempre boa, prosa.
Parabéns pela efeméride.
E, Parabéns a esta confraria, que esta de parabéns por aqui se poder encontrar escrita como esta, "o 2000".
Forte Abraço

Obrigado amigo Edu por mais uma historia deliciosa... por momentos recordei a avenida durante os gloriosos anos 80 que mesmo durante a tarde ja fervilhava de tanta oferta.

Recordo-me de o meu primeiro dia na faculdade em que vim de Benfica ate a avenida a pé para ver as meninas e converter a minha mesada numa subida a pensão ali na esquina rua da Gloria com uma loira voluptuosa que tinha uma irma que atacava na mesma esquina

Caro eduardo, parabéns pelas 2 milenas e obrigado por mais uma boa crónica.

Também tenho de abrir o meu baú de recordações de rua, tenho umas boas para partilhar

Os meus parabens carissimo confrade...é sem duvida dos confrades que mais admiro aqui no tasco...

Parabéns pelas 2 milenas Confrade eduardob.
A sua prosa fez-me regressar por momentos ao local onde me iniciei nestas "artes" nos idos 80's, Rua das Pretas....Avª da Liberdade....Café Lisboa.
Quem sabe se eu não andava por lá quando do problema com o MM.

Abraço

Caros confrades, muito obrigado pelos comentários. Não posso deixar de vos responder um a um:

Caro JM: Conte sempre comigo para as "curvas"! Grande abraço!

Caro Wolf: Obrigado! Too kind! (Como não te posso negar nada, em breve vou "dessonegar", em tua honra, uma "pérola" da rua que tenho mantido escondida num estojo ) ... Aquele abraço!

Confrade Envolvente: Obrigado pelas memórias da putanhice coimbrã. E persista, persista! Abraço!

Olha o Lucky Luke! Thanks, partner! Pegue lá um abraço cerrado!

Confrade Carlos Magno: Obrigado pelas simpáticas palavras. Não me faça corar! Abraço!

Amigo Safado, nada como partilhar tais recordações. Que tempos incríveis hein? De Benfica, A PÉ? Isso é que é esforço e dedicação! (Acho que me lembro dessas irmãs...). Também havia duas primas morenas, uma boazíssima, a outra um chaço, e a boa queria sempre impingir-nos o traste da prima ... Só memórias! Abração amigo (e cumpincha!).

Confrade Beret, obrigadíssimo! E continue a recordar-se, dos bons momentos como dos outros, hehehe! Abraço!

Amigo ggato, presente!!!... Um grande obrigado! A admiração é mútua, acredite. Pegue lá um abraço à maneira!

Confrade Merlin, obrigadíssimo! Também conhece bem a geografia daquela zona, hein? Se não esteve lá dessa vez, de certeza que esteve noutras (muitas, acredito... ). Um abraço deste companheiro de aventuras no trottoir.

Obrigado, confrade Toni, embora haja bastantes confrades com boa pena aqui no fórum. Um abraço.

Grande história, confrade - e uma crónica saborosa (deu para sentir o ambiente). Parabéns e que venham mais dois mil post´s.